segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Obon: Uma celebração aos mortos


Durante o feriado, japoneses “recepcionam” com festas os espíritos de entes queridos

Em meados de agosto, no auge do verão, japoneses viajam em massa rumo à terra natal. É o feriado do obon, quando o povo relembra seus mortos. Pelo antigo calendário, o obon é celebrado entre 13 e 15 de julho – já no calendário atual,ele ocorre de 1 a 3 de setembro. No entanto, a maioria das regiões celebra a data entre 13 e 15 de agosto, quando as pessoas visitam o túmulo da família (ohaka-mairi) para limpá-lo e comunicar fatos novos, como nascimentos e uniões. Monges budistas são chamados para fazer a oração aos mortos e as comunidades reúnem-se a noite, para dançar o bon-odori pela alma dos antepassados. Como muitas pessoas retornam à cidade natal, é uma oportunidade de rever amigos. Levantamento feito pela empresa de transporte ferroviário Japan Railways revelou que, até o dia 29 de julho, haviam sido feitos 3,48 milhões de reservas nos trens operados por ela, para o período de 7 a 16 de agosto. Já as polícias das províncias preveem congestionamento, pois as rodovias baixaram a tarifa do pedágio para quem usa o sistema automático de cobrança.



Lanternas são lançadas nos rios de 
Hiroshima todos os anos, em memória aos mortos






Qualquer pessoa pode participar
do Gujo-Odori, na província de Gifu



Rituais

O obon começa com a “recepção aos mortos” (mukae-bi), na tarde do dia 12 ou 13 de agosto, quando uma lanterna com o símbolo da família é acesa. O ritual repete-se todas as noites do período. Muitas famílias acendem uma fogueira em vez da lanterna. Verduras e frutas colhidas na horta da casa, comida servida sobre folha de lótus ou de inhame são oferecidas no altar. Figuras de animais feitas com berinjela e pepino, com patas de gravetos, também são colocadas no altar: o pepino seria o cavalo, que traz o espírito dos mortos com rapidez, e a berinjela o boi, cujo caminhar é mais lento. Esses animais são chamados de shouryou uma. 
Três dias depois, os espíritos voltam para o mundo dos mortos. Novamente, a fogueira é acesa e recebe o nome de okuri-bi (fogueira da despedida).


Origem 

O obon originou-se do uranbon-e (do sânscrito ullanbana), celebração budista da Índia. Segundo a lenda, Maudgalyaayana (em japonês, Mokuren), discípulo do Buda Shakyamuni (Shaka), tinha o poder de visão mágica e viu a mãe morta no inferno. Ofereceu-lhe comida, mas, ao chegar à sua boca, o alimento pegava fogo. Condoído, pediu conselho a Buda, que disse que, fazendo oferenda a todos os monges, uma parte chegaria à alma da mãe. Assim, os budistas passaram oferecer comida aos monges. A dança bon-odori representa a alegria da mãe de Mokuren ao ascender ao céu.


Símbolos

O fogo é um dos principais símbolos do obon. Presente na lanterna e na fogueira de recepção, ele sinaliza a casa, para onde a alma deve retornar. Já no final do período da celebração, o fogo tem a função de iluminar o caminho até o mundo dos mortos. Também teria a função de espantar os maus espíritos que porventura tenham vindo junto. Em Quioto, as famílias substituem o okuri-bi pelo Gozan Okuri-bi, grandes fogueiras em forma de ideogramas ou de desenhos nas cinco montanhas que rodeiam a cidade. A província parece arder em chamas por causa da luminosidade das fogueiras e moradores de Quioto dizem que “parece que se abriu a porta do inferno”. Não se sabe exatamente quando começou a tradição, mas acredita-se que tenha sido na era Heian (séc. VIII a XII).


Em Tokushima, o Awa-Odori atrai milhares de espectadores no período do obon


Já em outras regiões, a fogueira da despedida é substituída pelo toorô-nagashi (lançamento de lanternas no rio ou no mar). No Japão, o toorô-nagashi é realizado antes do período do obon, pois as cidades de Hiroshima e Nagasaki celebram as vítimas da bomba atômica com o ritual nas noites de 6 e 9 de agosto, respectivamente.


Bon-odori

Uma das atrações da celebração dos mortos é o bon-odori (dança de finados), dança coletiva feita em torno de um palco, ao som de flauta e taikô. Ela representa a alegria dos mortos ao se livrar do sofrimento do inferno.

Em Gujo-Hachiman, Gifu, o obon é celebrado com danças que duram a noite toda, de 13 a 16 de agosto. O Gujo-odori, como é chamada a dança, também é realizado nos finais de semana de julho a setembro. Nas quatros principais noites, o evento chega a reunir 250 mil pessoas na cidade. As coreografias de Gujo são diferentes das coreografias de bon-odori de outras regiões. Elaboradas ao longo de 400 anos, as canções e coreografias refletem a história da região: em Koneko, os dançarinos imitam os gestos do gato, considerado importante aliado, porque caçava ratos que atacavam a criação do bicho-da-seda. Já Harukoma reproduz os gestos dos cavaleiros ao domar potros. Tanto a produção de seda como a criação de cavalos eram importantes fontes de renda da região.




Habitantes de Quioto despedem-se
dos mortos com o Daimonji-Yaki

Na província de Tokushima, a atração é o Awa-odori. As coreografias são dançadas em grupos, chamadas ren, entre 12 e 15 de agosto, em cidades como Tokushima e Awa. Participantes de ren usam o mesmo yukata (quimono de verão) e kasa (chapéu de palha), no caso das mulheres, e hanten (veste curta masculina), no caso dos homens. Dados de 2006 mostram que cerca de 960 ren participaram do Awa-odori, reunindo até 1 milhão de participantes. O Awa-odori teria começado em 1586, quando Hachisuka Iemasu, detentor das posses da região de Awa, construiu o castelo de Tokushima, liberando o povo a dançar como quisesse. Assim como o Gujô-odori, foi proibido diversas vezes ao longo da história, mas a tradição popular resistiu e, hoje, ambos os eventos são fortes atrações turísticas e recebem recursos oficiais.

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